José Renato Figueiredo de Moura nasceu no Rio de Janeiro, mas há muito tempo adotou Paraíso, a terra de sua mãe, como sua também. Aos 42 anos já tentou cursar engenharia de materiais, administração hoteleira, mas rendeu-se à atividade ancestral de sua família e acabou apaixonando-se pelo café.
Já fez diversos cursos para se especializar em café e atualmente é juiz de barista e costuma viajar aos países produtores, como fez recentemente ao passear pelos cafezais nas montanhas íngremes da Colômbia. Na fazenda que foi de seu bisavô está preparando um café especial para, no futuro, entrar no mercado da bebida gourmet. Morou em grandes centros, inclusive na Inglaterra e seu coração amolece quando fala dos filhos João, de 10 anos e Isabela de 9.
Jornal do Sudoeste – Você é mais paraisense ou carioca?
José Renato Figueiredo de Moura – Hoje sou mais paraisense do que carioca. Gosto muito do Rio de Janeiro, morei muitos anos em São Paulo, mas decidi que não quero mais a cidade grande em minha vida. Acho os grandes centros muito bons, oferecem o que se quer a qualquer hora do dia ou da noite, mas se paga um preço muito alto para morar em uma cidade assim, que é a qualidade de vida.
Jornal do Sudoeste – Por que você foi morar em São Paulo?
JRFM – Na época fui estudar engenharia, depois fiquei um ano na Inglaterra para aprender inglês e quando voltei estudei administração hoteleira e trabalhei por um bom tempo em diversas funções em hotéis de São Paulo. Eu estava trabalhando, mas não estava gostando. Voltei para Paraíso, fui trabalhar na Cooparaiso, onde aprendi a degustar e classificar café. Retornei a São Paulo, em 2005, quando estava começando a moda das cafeterias especiais e fiz um curso de barista. Fui trabalhar em cafeteiras na elaboração de menus com cafés, treinamento de equipes, montagem de cafeterias. Mas eu me perguntava: “o que estou fazendo aqui trabalhando para os outros como um maluco, se eu posso trabalhar para mim como um maluco?”
Jornal do Sudoeste – Foi assim que você foi trabalhar com café?
JRFM – Desde 2004 estou envolvido com o café. Foi aproveitando que desde meu bisavô materno a família planta café. Meu avô era cafeicultor na Fazenda Jalmma, São Tomás de Aquino. O nome à propriedade é curioso e foi montado com as iniciais de toda a família: de meu avô, José; da minha avó, Alice; Luciano, o filho mais velho; Márcia, a segunda filha; e Maria Alice, a caçula, que é minha mãe. São 195 mil pés de café, em lavouras de idades diferentes, divididas em 50 hectares da área do cafezal e produtividade de 30 a 40 sacas por hectare, com colheita 100% mecanizada e somente três funcionários. Esse ano eu consegui fazer o melhor café de todos os tempos, com a primeira safra de uma lavoura nova, usando uma secagem totalmente diferente do que fazem na região. Em terreiro de concreto, foi muito bem espalhada a quantia de uma carreta de café que havia colhido no dia, ficando três dias sem movimentá-lo, depois foi muito bem mexido. Desta forma a seca foi mais lenta e resultou em um grão com acidez bem interessante.
Jornal do Sudoeste – Além de barista e degustador, você fez outros cursos relacionados ao conhecimento em café?
JRFM – Fiz também um curso de degustação no Senar Minas, um curso de torra na Dinamarca, na Cafeteria The Coffee Collective, com o torrador Peter Dupon e na Noruega, pois na Europa a torra de café é feita com muito mais ciência. Quando ultrapassa o ponto ideal de torra do café, o gosto é de cinza. Fui campeão mineiro de barista em 2008.
Jornal do Sudoeste – O produtor de café não tem sido remunerado como deveria. Como você essa situação?
JRFM – O produtor de café ganha dinheiro na economia. É interessante pensar que o produtor de café é o único que não coloca preço naquilo que produz. No café a Bolsa de Valores de Nova York põe o preço e os atravessadores ganham. O produtor tem que mapear e melhorar os seus processos para perceber onde pode economizar e é reduzindo o custo que terá o lucro, mas aqui na região não se valoriza a qualidade e o maior problema do produtor é o preço feito sobre muita especulação. E não pode depender de banco, pois não há garantia nenhuma de que ele conseguirá pagar com o café e o lucro que você tem o banco colhe.
Jornal dos Sudoeste – O café gourmet está na moda e é rentável. Mas 80% dos produtores de café não trabalham para fazer esse produto. Essa é uma situação dispare?
JRFM – Eu planejo, por exemplo, manter minha produção de café commoditie e separar uma lavoura para manejá-la de modo diferente, a fim de produzir um café especial. Faço um trato fitossa-nitário melhor, aplico mais adubo, colho na mão e faço uma colheita seletiva no ponto correto de maturação. Não vou participar de concursos por enquanto. Se o café não for torrado no ponto de ideal, não alcança bons resultados e também acredito que o preço pode ser obtido de forma diferente. Hoje a fazenda abre portas para compradores estrangeiros que pagam mais de R$ 1 mil em uma saca de café e já levam o produto. Eu prefiro que meu café seja conhecido pela qualidade do que por ter ganhado um concurso.
Jornal do Sudoeste – Quais são seus planos para futuro?
JRFM – Quero trabalhar muito para montar uma marca de café, captando bons cafés de vários produtores, incentivando a produção diferenciada e que dê e vender direto para as cafeterias dos grandes centros. Estou tentando mudar um pouco a metodologia de trabalho na minha fazenda, para que eu possa fazer um pouco de café especial e vendê-lo para o meu consumidor final.
Jornal do Sudoeste – O que se pode fazer para melhorar a situação da cafeicultura brasileira?
JRFM – Marketing. Produtor de café não é um grupo unido. É preciso fazer uma forte campanha de marketing para valorizar esse produto tão especial. Estamos na Copa e não se ouviu falar do café brasileiro em lugar nenhum. O Funcafé liberou agora R$ 900 milhões e nada foi gasto em marketing. O pessoal do exterior acredita que o café do Brasil é só aquele que serve como base para outros blends (mistura do produto). Lá fora nosso café é rebaixado e temos cafés maravilhosos e quem produz esse café tem que brigar sozinho para vender melhor o seu produto e nós aqui ficamos com o resto. As cafeterias brasileiras também não treinam o seu pessoal para fazer a coisa certa. O café é um momento de prazer, é preciso ritual para fazê-lo, por exemplo.
Não há como ser coisa boa pagando R$ 16, por esse preço estamos comprando lixo. Um café gourmet tem que custar na gôndola do supermercado, no mínimo, R$ 35.