Adriano Rosa Silva
Assim como comemoramos em 21 de abril a morte por enforcamento em 1792 do mártir da Independência, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, o movimento negro luta no Brasil para ver reconhecido como feriado o dia 20 de novembro, data do assassinato de seu líder máximo, Francisco Nzumbi – herói nacional e guerreiro do Quilombo dos Palmares, ocorrido quase um século antes, em 1695. A proposta já teve aprovação na Comissão de Constituição e Justiça na Câmara dos Deputados em Brasília.
Porém, contudo, todavia e, entretanto, volta-se a lengalenga e o assunto ainda é discutido nas casas legislativas — muitas das vezes motivados por representantes do comércio e indústria, ou por parlamentares desinformados que almejam ficar “bem na fita” com parte de eleitores por estes bancarem suas campanhas, que a data não seja feriado, mas ponto facultativo, permitindo que lojas abram suas portas e façam seus funcionários trabalharem normalmente, pois aí não gera adicional no salário ou hora extra. Assim como o racismo, de forma velada e disfarçada, ainda encontramos casos de trabalho escravo por aí... por aqui...
Vivemos em uma sociedade extremamente capitalista, onde o dinheiro é a mola mestra do mundo. Um feriado a mais ou a menos, parando máquinas e calculadoras, não vai quebrar as pernas de empresas e fechar as portas do comércio. O que faz isso acontecer, constantemente, e leva as pessoas a comprar fora de Paraíso, são os preços altos e a falta de variedade de marcas nas prateleiras, o mau atendimento, o não pagamento de direitos trabalhistas motivando pilhas de ações na justiça, a exploração da mão de obra, a falta de oportunidade para jovens, idosos, quem está querendo seu primeiro emprego e sempre esbarra na exigência de experiência... Isso a defensora Associação Comercial, Industrial, Agropecuária e de Serviços (Acissp), parece que não vê.
Duas vezes por semana, ônibus de sacoleiros saem lotados com paraisenses, incluindo lojistas, que vão à cidade de São Paulo para fazer compras na região do Brás e na Rua 25 de Março. Compram baratíssimo lá fora (até sem nota) e revendem caríssimo aqui dentro. Quanto a isso a nossa Acissp também não diz um “A”. Em anos anteriores esta associação, liderada por seu presidente que, na época, era vereador e presidente da Câmara, já derrubou o feriado do dia 8 de dezembro, consagrado à Imaculada Conceição — data correta para se levantar na Praça da Matriz as Bandeiras dos Santos padroeiros da nossa mais tradicional festa, as Congadas. A comunidade negra vai deixar, mais uma vez, o coro dos insatisfeitos prevalecer? Os navios negreiros, as correntes, chibatas e senzalas a que foram submetidos nossos ancestrais — inclusive aqui em Paraíso, e a luta do líder Zumbi pela nossa libertação, não merecem mais respeito e um feriado nacional? Somos parte da construção desta cidade, deste País e ainda sofremos na pele muito preconceito!
O 20 de Novembro é para celebrar a morte de Zumbi dos Palmares — e, em minha opinião, o feriado deveria ter este nome: Dia de Zumbi. A “consciência” deve ficar na mente de cada um, que respeita seu passado, faz memória aos seus líderes e enaltece sua História, seja ela de negros, brancos ou índios... Por força de lei, as escolas municipais já discutem a questão racial na Semana de Estudos anterior ao dia 20. De 2007 a 2011, um grupo de pessoas no qual eu integrava, realizamos um evento paralelo, a SECON, para abrilhantar ainda mais este tema. Fizemos baile, feijoada, concurso, homenagens; havia debates, palestras, filmes e documentários... Para que isto retorne com força e brilhantismo, é preciso organização, conteúdo, elemento humano e recursos. “Uma andorinha só não faz verão”...
“Valeu Zumbi / O grito forte dos Palmares / Que correu terras, céus e mares / Influenciando a Abolição...” — que só viria a acontecer 193 anos depois de sua morte com a assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel, em 13 de maio de 1888. É disto que se trata o 20 de Novembro! É esta memória que queremos deixar viva e marcada com ferro quente em nosso calendário! O feriado reforça este pensamento, não deixando que a data seja esquecida assim como tantas outras por aí. Associação Comercial: não chore na Câmara Municipal ou na EPTV... Prefeito e vereadores: mantenham o feriado nos próximos anos e não sigam na contramão da História. Em dezembro as lojas já ficam abertas até às 22h, com horário especial inclusive no sábado e domingo. Máquinas estarão a pleno vapor, dinheiro circulando e vendas sendo reforçadas. E para, depois, as pessoas comemorem o quê? O dia de Natal – feriado em honra e glória ao nascimento de Jesus, nosso único Salvador, que também tem sua morte na cruz lembrada e celebrada por outro feriado na sexta-feira da Paixão, assim como Tiradentes citado no início deste artigo, e assim como pleiteamos que seja com o nosso líder máximo, Zumbi dos Palmares!
Adriano Rosa Silva é jornalista e militante da causa negra.