Reforma da Previdência (PEC 287), que deve ser votada em primeiro turno no plenário da Câmara dos Deputados, no próximo dia 28, e agora se apresenta em um cenário instável, tem recebido grande repercussão, sendo alvo de inúmeras críticas dos mais variados setores da sociedade e também defendido como “necessário” por outros. Em Paraíso, o tema foi motivo de manifestação em ato nacional contra a PEC 287, grande número de pessoas às ruas na quarta-feira (matéria nesta edição). Para a juíza da Vara do Trabalho em São Sebastião do Paraíso, Adriana Farnesi e Silva, a reforma não traz benefícios e a tendência é de precarização dos direitos trabalhistas.
Atualmente, conforme explica a magistrada, para a previdência prevalece a regra 85/95, ou seja, para se aposentar, de forma integral, a soma da idade com o tempo de contribuição deve ser de 85 anos para as mulheres e de 95 anos para os homens, respeitando-se o tempo mínimo de contribuição, respectivamente, de 30 e 35 anos. Não há idade mínima, exceto no setor público e para os trabalhadores rurais (segurados especiais) que é de 55 anos para as mulheres e 60 para os homens.
“Se uma mulher começou a trabalhar com 25 anos e contribuiu durante 30 anos ininterruptos, estando atualmente com 55 anos, poderá se aposentar de forma integral, pois a soma da idade com o tempo de contribuição alcança 85. A proposta do Governo fixa idade mínima de 65 anos (sem diferenciação entre mulher e homem e aplicável também aos servidores e trabalhadores rurais) e eleva o tempo de contribuição, para a aposentadoria integral, para 49 anos. Com essa regra, a mulher que começar a trabalhar aos 25 anos, só se aposentará de forma integral aos 74 anos, caso contribua durante 49 anos de forma ininterrupta”, elucida.
Segundo a juíza Adriana, a idade mínima de 65 anos não se associa nem mesmo com os países onde a expectativa de vida é bem maior que a dos brasileiros. Ela cita, como exemplo, a Itália, onde a idade mínima para a aposentadoria é de 53 anos. “Há possibilidade de se aposentar antes. Atualmente, desde que haja 15 anos de contribuição – o que é chamado de carência –, a pessoa pode se aposentar, mas haverá a aplicação do fator previdenciário que reduzirá o valor do benefício”, ressalta.
De acordo com a juíza, a nova proposta do Governo, além da idade mínima de 65 anos, eleva o prazo de carência de 15 anos para 25 – 10 anos a mais – e, em substituição ao fator previdenciário, prevê pagamento de benefício de 76% da média dos salários de contribuição mais 1% por ano adicional de contribuição. “Assim, uma mulher com 65 anos (idade mínima) e 30 anos de contribuição, pelas novas regras, em caso de aposentadoria, só receberá 81% da média dos salários de contribuição. Para receber 100% dessa média, teria que trabalhar mais 19 anos”, acrescenta.
Além disso, a juíza destaca que a base de cálculo do valor do benefício também mudará. “Atualmente, o cálculo é feito a partir da média dos 80% maiores salários de contribuição, ou seja, 20% dos salários mais baixos são descartados na hora do cálculo. De acordo com a nova regra, se aprovada, o benefício vai corresponder à média simples de todos os salários de contribuição, inclusive os mais baixos. Aposentados e aqueles que completarem os requisitos atuais até a aprovação da reforma não serão afetados. Haverá regras de transição para quem estiver com 50 anos ou mais (homens) e 45 anos ou mais (mulheres) que poderão se aposentar pelas regras atuais, pagando pedágio de 50% sobre o tempo que falta para a aposentadoria”, explica Adriana Farnesi.
Dentre outras mudanças, está prevista a revogação da aposentadoria especial dos professores do ensino fundamental e médio, como já acontece com os professores de universidades, e dos policiais civis; a redução da pensão por morte e a impossibilidade de receber aposentadoria e pensão ao mesmo tempo. “Para se aposentar com integralidade do benefício aos 65 anos (idade mínima), a pessoa teria que começar a trabalhar com 16 anos, não pode ficar desempregada, nem deixar de contribuir nenhum dia. Na prática, diante do desemprego imenso no país e da alta rotatividade, as novas regras representarão o fim do direito à aposentadoria para a maior parte da população brasileira e uma redução drástica do valor do benefício daqueles que conseguirem se aposentar”, destaca a magistrada.
A juíza Adriana comenta que o governo justifica ser necessária a reforma para assegurar a sustentabilidade do sistema, atualmente deficitária. “Há estudos que indicam que o orçamento da Seguridade Social tem se mantido superavitário e que recursos oriundos das receitas previdenciárias (inclusive os milhões que são arrecadados pela Justiça do Trabalho todos os anos), são utilizados para outras finalidades, sem a devida transparência”, avalia.
“A desconstrução de um governo social – aqui entendido como aquele que se preocupa com o bem-estar social – vem sendo engendrada de uma forma dissimulada e cruel, não só com a reforma da previdência, mas com a reforma trabalhista que está por vir com a intenção clara de precarizar os direitos dos trabalhadores. Essa precarização, de forma alguma, contribuirá para tirar o país da recessão econômica. Trata-se de uma falácia afirmar que a reforma da Previdência é indispensável à retomada da estabilidade econômica. Indispensável só se for para que o Governo continue retirando bilhões da seguridade social para outras finalidades e concedendo desonerações tributárias a empresas. Crise econômica se combate com transparência, corte de gastos supérfluos, investimentos em tecnologia, inovação e educação e extermínio da corrupção”, completa a juíza da Vara do Trabalho.