Pec do calote
A equipe econômica do Governo Bolsonaro busca receita para custear as despesas da desaceleração econômica brutal decorrente das medidas de lockdown e distanciamento social por conta da pandemia. Também ocorreu nesse meio tempo a “farra da Covid”, que obrigou ao Governo Federal distribuir indiscriminadamente recursos bilionários a estados e municípios sem deter consigo as rédeas do controle sobre os efetivos gastos no combate ao vírus. Claro, é a consequência direta daquela decisão do supremo Gilmar Mendes que retirou da condução do presidente da República a gestão da crise sanitária e econômica vivenciadas por conta de uma trapalhada chinesa de laboratório. Essa conta deveria ir direto para o ministro Gilmar e para o premiê chinês. Ficaríamos livres da conta amarga que não merecemos pagar – nós contribuintes. Quanto ao governo Federal, em que pesem as excelentes intenções do presidente, seu chefão da Economia está se esquecendo da classe média e por isso tenta impedir o pagamento de dívidas judiciais do erário. Comete ilegalidade para conseguir elegibilidade.
O orçamento secreto
Existem emendas orçamentárias que não precisam de escopo e nem justificativa, autorizadas por lei e admitas constitucionalmente. Nunca houve problema com elas, sempre foram sancionadas e viraram dinheiro. Até agora. Com o governo Bolsonaro é (sempre) diferente, e a suprema Rosa Weber apelidou a estratégia parlamentar que sempre existiu de “orçamento secreto”, por desconfiar que seria utilizado pelo presidente em troca de apoio parlamentar. Estão combatendo o homem nas redes sociais, na mídia, no parlamento, onde quer que seja possível evitar-lhe a inexorável reeleição. Na verdade, põem em pé de guerra o país, a começar pelas celebridades da indústria cultural que incendeiam a polarização política dos seus acólitos junto ao público em geral e depois pôr fogo neste circo tupiniquim vão viver na Europa ou na Flórida, que ninguém é de ferro, e deixam o pau quebrando no Brasil. Onde acham que vivem, de fato, Caetano Veloso, Chico Buarque, Paulo Coelho e Xuxa?
Deltan fora do MP
Juízes e membros do Ministério Público devem ter posicionamento politico ideológico discreto e político-partidário zero, para o bem ou para o mal. Quando não o fazem, acontecem três coisas: a) passam a ser tratados como políticos e celebridades e, como tais, a receber vaias e aplausos: os primeiros lhes ofendem, os segundos aguçam-lhes o ego indevidamente; b) seu posicionamento processual passa a ser questionado e sua independência e imparcialidade criticadas c) acabam frustrados na carreira de origem e, catapultados ao picadeiro da política, novos ovos podres os aguardam. Foi assim com Moro e Witzel, será assim com Deltan Dallagnol. Essa gente perdeu o sossego e, para viver em paz, terá que morar em uma ilha deserta após a aposentadoria – e antes dela andar escoltada ou viajar em voos da FAB exclusivos. Não dá pra frequentar aeroporto ou morar em condomínio mais não. Deltan é o exemplo concreto de que a ética e o ensino jurídico foram pro brejo no país: a chantagem a que submeteu Rodrigo Janot, então PGR (e que a denunciou em livro), para permitir o prosseguimento da Lava Jato, sequer foi negada por ele: implicitamente partiu para a perigosa tese de que “os fins justificam os meios” e bola pra frente. E Deltan sempre preferiu muito mais as páginas de redes sociais do que aquelas dos autos dos processos. No auge de uma crise que prejudicava a governabilidade da nação, derrubava o real frente ao dólar e afetava a sucessão presidencial, tramava majorar honorários que cobraria por palestras Brasil à fora, vivendo da fama. Assim ele gastava seu tempo enquanto por aqui o terror político campeava. Deltan ter saído do MP é, portanto, explicável. Difícil é explicar como entrou.
O poema da verdade – Drummond
A propósito das fake news, sucessivas vezes tratadas aqui, e dos óculos da estátua de Carlos Drummond de Andrade, furtados pela enésima vez da orla carioca, tornou forçosa a conexão destes assuntos. Aí, o bom amigo e defensor público Jessé Gaiotto rememorou a este esquecido poema de Drummond, “A verdade”:
A porta da verdade estava aberta, mas só deixava passar meia pessoa de cada vez.
Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava só trazia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.
Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso onde a verdade esplendia seus fogos.
Era dividida em metades diferentes uma da outra.
Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar. Cada um optou conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.
O dito pelo não dito:
“Enquanto tiver bambu, tem flecha.” (Rodrigo Janot, ex procurador geral da República).
RENATO ZUPO – Magistrado, Escritor