Menos justiça, mais parlamento
A PEC que retira poderes do Supremo Tribunal Federal responde institucionalmente à terra arrasada deixada por inúmeros posicionamentos dos integrantes da mais alta corte de justiça do país. O mal-estar causado deriva de diversos fatores: pró-ativismo judicial, viés ideológico em decisões que se imiscuem no funcionamento de outros poderes da República, ofensas diretas ao estado de Direito, decisões monocráticas em demasia e menos conformidade colegiada. Não há segurança jurídica nacional que se sustente assim. Agora o Congresso quer criar quórum qualificado de dois terços dos ministros para que qualquer decisão do STF com eficácia legiferante (de criar ou transformar leis) possa então ser apresentada para convalidação pelo Senado da República que ainda poderá se valer de plebiscito junto ao povo para ratificar ou retificar as decisões do Supremo. Também quer aumentar a idade mínima para o ingresso na corte e criar um mandato de nove anos para os ministros que não seriam, assim, vitalícios. Na prática, submete o Poder Judiciário ao Parlamento e querem saber de uma coisa? Em todas as democracias do mundo a independência de julgar esbarra no império das leis. Isso é o Estado funcionando e melhorando. Se nosso congresso tem atrofias e distorções, é muito mais passível de correções a cada quatro anos através da vontade popular. E estamos mais acostumados a lidar com políticos ruins do que com juízes ruins. Não sei se a PEC vai funcionar, sinceramente. Não sei se o Brasil vai continuar funcionando.
Perguntar não ofende
Alguém pode me dizer o que foi feito dos resultados, dos relatórios e falatórios, da CPI da Covid? Deu em quê? Lembrem-se, por favor, do que digo aqui sobre 99% das CPIS: só desgastam e acabam em Pizza.
Imagem Fake
Tem foto editada de campanha do PT no nordeste, em 2012, lançada na mídia para parecer uma caravana atual pré-campanha de Lula para o retorno pretendido à presidência da República. E é claro que isso não vai virar condenação, porque quando acontece à esquerda é livre manifestação de pensamento e opinião. Noves fora isso, que todos já sabemos, a tecnologia propicia tantas liberdades com imagens e informação que nestas eleições, e depois delas, vai faltar cadeia, processo, condenação e juízes para tanta transgressão – se o TSE resolver pegar “pesado” (sic) com as Fake News como seus líderes andaram prometendo. A coisa toda é de uma infinita bobagem. Proibir distorção de imagens e de informação é como proibir arrotar na mesa – é inviável de ser cumprido e não há sanção que resolva. É como proibir pré-campanha eleitoral. Lula e Bolsonaro estão nela há quatro anos. Lula da cadeia, inclusive. E doações de campanha, caixa 2 e 3 também. Besteira proibir isso tudo – quem é que segura o poder econômico, quando o empresário quer apoiar a um político? Se não puder fazê-lo por cima do pano, o fará por baixo. Como juiz, sempre me preocuparam decisões inexequíveis, que não somente não funcionam, mas tumultuam a sociedade e não resolvem aos seus problemas, gerando descrédito ao invés de harmonizar o funcionamento do Estado político. A solução para as fake é criar um selo de qualidade de proteção da informação e uma agência reguladora (que na teoria já existe) para submeter os conteúdos de cada mídia a fiscalização contínua e apartidária. Se o conteúdo é sério, ganha o selo de qualidade e o público alvo é que faz o julgamento. Quem não tiver o selo, cai na busca orgânica do Google e no ostracismo. É o mercado, ao final das contas, que dita as regras de uma sociedade de consumo, mesmas regras que devem ser vez ou outra escancaradas, demolidas e anuladas, quando são inúteis e não pacificam à sociedade. Proibir pré-campanha ou conter apoio financeiro em eleições é inútil. Os EUA, sempre muito à nossa frente, aboliram essa contenção há décadas.
Combustíveis que caem, temperatura que cresce
Não foi o STF que mandou abaixarem os preços dos combustíveis nas bombas dos postos, foi a decisão da equipe econômica do governo Bolsonaro que já se fez refletir no combate à carestia, inclusive pelo endosso federal da receita do ICMS descontada dos estados e da conta do consumidor. É surreal crer que podemos controlar alíquotas e consumo através de decisões judiciais, sejam elas emanadas da mais alta corte de justiça da República ou de um juiz de comarca do interior. E é triste verificar que o STF serve às mazelas nacionais resolvendo quase tudo, porque tudo a ele é submetido. A atual composição e mesmo a anterior, todas duas a cara dos governos que as instituíram, cuidaram de criar uma cultura de placebo e panaceia de todos os males segundo a qual as mais variadas temáticas e matérias afetas a outros poderes podem e devem ser discutidas no Supremo. Ministros são juízes e juiz que atrai para si demandas indevidas coloca a instituição em um local em que não deveria estar, acoplada a uma competência que não é a sua e, com ela, à críticas desnecessárias e desgastes inúteis. É por isso que o Parlamento quer mudar tudo, de novo, no funcionamento do Poder Judiciário, desta feita de cima para baixo e a começar do STF.
O dito pelo não dito
“Quando a liberdade de expressão nos é tirada, logo poderemos ser levados, como ovelhas, mudos e silenciosos, para o abate”. (George Washington, primeiro presidente dos Estados Unidos).
RENATO ZUPO – Magistrado, Escritor