Boris Johnson renuncia
Entender o sistema parlamentar não é fácil para nós brasileiros. O sistema parlamentar britânico (inglês), então, é bastante complexo. O Premiê, ou primeiro ministro, inglês Boris Jhonson acaba de renunciar - ou ao menos “acaba” de renunciar no momento em que escrevo a estas maltraçadas linhas. O conceito de momento sumiu com o advento da digitalidade e dos meios de comunicação de massa atrelados à internet, não é mesmo? Bom, voltando ao assunto. Quando um partido político ganha as eleições inglesas, assume o parlamento e a oposição que perdeu cria uma espécie de gabinete “fantasma” pra ficar do lado, apupando e enchendo o saco e torcendo contra, na espera da engorda do defunto. Se o governo eleito der errado, são convocadas novas eleições e assume a oposição até que o parlamento seja reformulado. Não possuindo o partido de Jhonson as necessárias coalizões para o funcionamento do governo, ele renuncia ou é destituído, como de fato renunciou. . Funciona bem por lá. Só por lá. Quem quiser se aprofundar sobre o parlamentarismo inglês, há um saboroso livro que recomendo: “Primeiro entre Iguais”, de Jeffrey Archer.
Conservadores que caem
Dirão que Boris Jhonson é dos últimos conservadores a cair e que Bolsonaro será o próximo - e irão se lembrar de Trump, Witzel, Antonio Kast (Chile), Le Pen (França), e do presidente de centro-direita argentino que perdeu a reeleição e cujo nome ninguém mais se recorda. Os ires e vires da política partidária são um fenômeno comum em qualquer democracia saudável do mundo, mas esta dança de cadeiras não é normal. Foi rápida e está sendo brutal. Em pouco mais de cinco anos o viés ideológico conservador cresceu incrivelmente e depois encolheu como em um efeito bolha econômico em que há um inchaço patológico que depois estoura em pústula. O motivo disto é a incômoda esquerda fora do poder. A sinistra fica desconfortável sem as rédeas que manteve no Brasil e no mundo por duas décadas e faz parte de sua estratégia inviabilizar governos eleitos que lhe sejam opositores. Implodem e sabotam politicamente a máquina governamental através de seus quadros partidários que a compõem e simplesmente não deixam funcionar o Estado, para depois reclamar do Estado que não funciona e lembrar aos eleitores “daqueles tempos bons” em que se governava para o povo através da esquerda.
Tempos bons?
Não houve tempo bom. Brasileiro tem memória de curtíssimo prazo, reformulada por informação distorcida com fortes vieses ideológicos. A criminalidade aumentou e o governo se endividou com Lula, o país quebrou com Dilma e os programas sociais nada resolveram, como não resolvem agora. Programa social tem que ser emancipatório - já o disseram dois vultos de envergadura, mas de biografias opostas: Reagan e Frei Beto. Custo a crer que se acredite em um discurso que prega o retorno aos bons tempos que não existiram e que a conversa político partidária progressista se perca em devaneios sobre os problemas que foram resolvidos durante seus governos populares, quando estes problemas não foram resolvidos nunca. Se não é assim, por favor, alguém me diga quais as mazelas brasileiras resolvidas por Lula ou Dilma?
A engorda do defunto
Gosto de estudar história para não repetir os erros do passado e aprender com eles, reconhecendo tendências que geralmente se repetem e que, para esta replicação, contam com a falta de cuidado do jornalista atual, que é, ou deveria ser, o historiador do presente. O plano real salvou a nossa economia e foi todo obra de um governo de centro esquerda comandado por dois marxistas comunistas de cadeirinha, FHC e José Serra, que no entanto tiveram o mérito de esquecer vieses ideológicos na gestão da nação. Ao menos, no que toca à economia. No auge do plano real, o PT e Lula votavam contra no parlamento e falavam mal do corte de zeros e da troca de moeda e alertavam ao povo que o país iria sofrer e as classes desfavorecidas da nossa sociedade iriam penar com o real. E deu no que deu: a estabilização monetária colocou o país no primeiro mundo, de onde só saímos com o retorno do populismo ao poder, através do PT. Você vota em quem quiser votar, amigo, e há excelentes candidatos em todos os partidos - minha obrigação aqui é impedir que seja enganado por notícias falsas que te façam perder a percepção do mundo através da distorção de conceitos, sobretudo jurídicos e políticos.
Aos antepassados
Fazer oposição, como fazem contra Boris Jhonson no governo inglês, é absolutamente comum. Tentar impedir os méritos do adversário político, ou deixar de reconhecê-los ou diminuí-los, pode ser um hábito, mas passa a ser mais pejorativo e perigoso. Agora, agir na surdina engordando o defunto, sabotando o Estado e indo contra os interesses nacionais, e dizer que nada disso ocorre, aí não dá. Não podemos nos calar. Não iremos nos calar. Meus antepassados morreram em guerras ou fugiram de suas terras destroçadas por ditaduras sanguinárias para que nós, hoje, pudéssemos desfrutar de uma democracia plena. Não podemos e não devemos nos calar. Que nos prendam, que nos matem. Nos calar diante do politicamente correto por covardia, jamais.
O dito pelo não dito
“Democracia é quando eu mando em você. Ditadura é quando você manda em mim.” (Millor Fernandes, humorista e escritor brasileiro).
RENATO ZUPO – Magistrado, Escritor.