ENTRETANTO

Entretanto

Por: Renato Zupo | Categoria: Justiça | 12-04-2023 14:23 | 1720
Foto: Arquvio

O Serial Killer de Blumenau
O Sul do Brasil, nossa região culturalmente mais desenvolvida, economicamente rica, teima em ter suas tragédias, demonstrando que a existência de facínoras e psicopatas não está ligada à pobreza, favelas ou falta de cultura. A criminalidade corriqueira talvez tenha seu berço na falta de estrutura familiar, mas as pessoas perversas nascem em todos os berços, sejam de caixote e papelão, sejam de ouro. No sul já tivemos o caso do Menino Bernardo morto pelo pai e pela madrasta, o caso da Boate Kiss, o caso dos sacrifícios satânicos de crianças no Paraná, dentre outros. Nos Estados Unidos, o país mais rico do mundo, também são comuns crimes sanguinolentos cometidos por criminosos hediondos. A hediondez, portanto, não está atrelada ao dinheiro, à cultura ou à educação. 

Tipos de criminosos
O criminalista Enrico Ferri, no Século 19, preconizava que há criminosos por hábitos adquiridos e criminosos natos, hoje chamados psicopatas. Sua escola positiva do Direito Penal caiu em descrédito pouco tempo depois, mas para mim sempre foi “a” escola e em trinta anos de estudos criminais jamais conheci um tipo criminoso que não se encaixasse em uma das hipóteses elencadas por Ferri em suas obras. O assassino serial catarinense é um psicopata e esse tipo de doente mental não conhece sentimentos como remorso, pena, culpa ou gratidão. Enxergam ao outro como “coisa” que lhe satisfaça aos desejos, é dissimulado e impetuoso. Psicopatas geralmente não usam drogas, são simpáticos e cativantes. Assim capturam suas presas. 

Pacientes judiciários
Como quase todos sabem, doentes mentais que não possuam discernimento não vão para a cadeia, no Brasil. São tratados em hospitais psiquiátricos, os antigos manicômios, ou fazem tratamento ambulatorial. Neste último caso sua “camisa de força” é química. Medica-mentos o controlam. Os perigosos assim diagnosticados por peritos psiquiátricos ficam internados por algum tempo, mas há um movimento antimanicomial no Brasil e no mundo, procurando teimosamente evitar ou diminuir ao máximo o período de internação de doentes mentais que praticam crimes – no Direito eles recebem o nome de “pacientes judiciários”.

Psicopata é doido?
O paciente judiciário, ou falando mais simplesmente, o doido que pratique crimes, fica cada vez menos internado no Brasil, quando fica, e não vai para a cadeia. Esse “doido” é chamado de inimputável na nossa legislação, o que significa que não pode ser punido porque não possui discernimento, que é a capacidade de distinguir o certo do errado e de agir conforme esta distinção que faça. Mas não tema. Psicopatas, como o de Blumenau, não são doidos. A psicopatia, apesar de ser classificada pela OMS como doença mental, não afeta o discernimento de quem a possua. O psicopata sabe, sim, distinguir o certo do errado – ele só não se importa com isso, porque não é dotado de sentimentos por outros seres humanos. Portanto, o serial killer de Blumenau haverá de pagar pelos seus crimes, muito embora a legislação penal brasileira não possua penas graves o bastante para castigar a um criminoso tão hediondo.

Pena de morte
É necessário mesmo enrijecer penas, recrudescer o castigo penal no Brasil. E não estou falando de pena de morte, com a qual não concordo, não porque tenha pena do criminoso. Não. Tenho pena é das vítimas. Só que, filosoficamente, não considero a “morte” um castigo. Morrer é tão natural quanto viver – e com a morte sofre somente quem fica vivo, o parente ou ente querido do morto. Mas o psicopata de Blumenau deve ficar na cadeia para o resto da vida, ao menos é o que ocorreria se as penas aqui fossem mais justas e rígidas. Na prática, no caso dele, equivaleria a uma prisão perpétua – mais do que certo. Gente assim não pode voltar ao meio livre.

O Bom silêncio
Critico aqui, sempre ao silêncio obsequioso da imprensa para com fatos jornalísticos importantes e que não são reportados por interesses obscuros e ideológicos, escusos e econômicos, pode escolher o motivo abjeto. No entanto, por vezes o jornalismo deixa de divulgar por motivos também nobilíssimos. É o caso do psicopata de Blumenau, com detalhes de sua vida e inclusive identidade omitidos pela imprensa, para não dar alarde a gente ruim e não criar mais uma bandidolatria, com esse psicopata virando objeto de culto – há muitos idiotas por aí que se deixam levar por qualquer minuto de fama, própria ou alheia.

Jardim de Infância de segurança máxima
Sem que se revele a identidade do serial killer de Blumenau, ainda assim sua ação vem sendo repetida ao longo do país e em diversas escolas, nas quais alguns outros psicopatas tentam entrar para machucar gente inspirados pelo macabro assassino catarinense. Até agora a polícia e as instituições estão caprichando em impedir que os números desta violência abjeta piorem com mais vítimas fatais, mas todo cuidado é pouco. Infelizmente, está acontecendo o que muitos estudiosos de criminologia e cientistas sociais previram ao longo de ao menos duas décadas: a degradação dos valores religiosos e familiares e o acesso irresponsável à informação e entretenimento de baixa qualidade, a cultura massificada e a ausência de preocupação com os conteúdos divulgados na mídia, tudo isto está começando a cobrar seu preço, liquidando moralmente as esperanças de um futuro seguro para os jovens brasileiros.

O Dito pelo não dito:
“A violência destrói o que ela pretende defender: a dignidade da vida, a liberdade do ser humano.” (Karol Wojtila, o Papa João Paulo II).

RENATO ZUPO – Magistrado (Juiz de Direito em Araxá), Escritor