Márcio Coimbra*
Os níveis de democracia vivem um período de especial erosão ao redor do mundo. Pelo menos 58 países vivem em regime autoritário, enquanto somente 24 são considerados democracia plenas. Entre ambos, uma vasta lista de países que variam de democracias imperfeitas a regimes considerados híbridos, nações que possuem problemas que as impede de serem democracias justas e livres.
O Brasil, considerada uma democracia imperfeita, vem perdendo posições ao longo dos últimos anos neste ranking, assim como outros países que enfrentam falhas significativas em aspectos que incluem cultura política subdesenvolvida, baixos níveis de participação política e problemas de governança. Isto sem contar violações contra a liberdade de imprensa e corrupção, gerando instabilidade jurídica e política.
Com vistas a sanar estes problemas, nosso país deveria se aproximar de democracias plenas, onde figuram a maioria dos países europeus e nossos vizinhos Uruguai e Chile. Infelizmente, tudo leva a crer que caminhamos em sentido oposto, nos alinhando e consolidando parcerias com países autocráticos e autoritários como Venezuela e Nicarágua em nossa região, além de Rússia e China, nações que sistematicamente desrespeitam os valores consagrados em nossas leis.
A nova leva de sócios do Brics é sintomática neste sentido. O Brasil agora está ao lado de países que sistematicamente desrespeitam os Direitos Humanos, violam de forma clara as leis internacionais, agindo contra a autodeterminação e soberania de outras nações. Etiópia, Irã, Arábia Saudita, Egito e Emirados Árabes Unidos são classificados como regimes autoritários, sem contar China e Rússia, membros fundadores. Argentina, Brasil, África do Sul e Índia são consideradas democracias imperfeitas. O clube, chefiado pela China, não possui sequer um membro considerado uma democracia plena.
Precisamos estar atentos aos rumos que nossas relações internacionais vêm tomando. Sob o argumento de que o Brasil teria o apoio de nações como China e Rússia em seu pleito relativo a uma remota possibilidade de reforma do Conselho do Segurança, nosso país tem relativizado a integridade do conceito de democracia, deixando de atuar como uma nação basilar na defesa de seus princípios no sistema internacional.
Vale lembrar que discutir a reforma do Conselho de Segurança se tornou uma pauta inócua, de uma prática diplomática ultrapassada que jamais encontrará respaldo entre aqueles com poder real de mudança. Uma diplomacia moderna enxerga um caminho baseado em princípios e valores, muito além de simples interesses: uma política de alto nível que encaminharia o Brasil a ocupar um lugar entre as democracias plenas.
Aos nos nivelarmos aos autocratas e autoritários do mundo, mergulhamos em terreno pantanoso, desconhecido de um Brasil que resgatou sua democracia poucas décadas atrás e que vem trabalhando para evitar arroubos que possam ferir nossas instituições. Na medida que vemos a democracia ser atacada, devemos nos posicionar como nação no sentido de defender seus pilares, nos colocando ao lado de países que defendem o mesmo arcabouço de valores. Ao final é nossa integridade como povo que está em jogo. Somos uma nação que jamais deve aceitar que sejam violados os direitos que um dia nos foram negados. Nos alinhar com autocracias é esquecer de nosso passado e rejeitar as conquistas do presente.
*Presidente do Instituto Monitor da Democracia
e Vice-Presidente da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig). Cientista Político, mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos (2007). Ex-Diretor da Apex-Brasil e do Senado Federal
(Hoje em Dia 02/09/2023)