OPINIÃO

Precisa corrigir

Mais do que uma caça aos erros, espera-se que com maturidade e urgência se concilie uma revogação da lei e critérios constitucionais mais equânimes
Por: . | Categoria: Do leitor | 07-02-2024 00:05 | 132
Foto: Arquivo

Por Vittorio Medioli

A Assembleia de Minas Gerais aprovou por unanimidade uma proposta de lei, de iniciativa própria (constitucionalmente, deveria partir do governo), que determina critérios de distribuição aos municípios da arrecadação de ICMS vinculada ao ensino fundamental (de responsabilidade municipal).

Nos últimos dias, chegando os primeiros pagamentos aos municípios com os novos critérios, o estarrecimento e o espanto tomaram conta de muitos prefeitos. Tudo isso apesar das sinalizações da assessoria técnica da Associação Mineira de Municípios (AMM), que criticava a proposta com os critérios que foram à votação.

Se a Assembleia deixou prevalecer fórmulas que agridem colunas da Constituição como equidade e proporcionalidade, também a assessoria do governo de Minas não fez qualquer reparo ou proposta de veto durante o trâmite nem na sanção da lei. Isso ocorreu apesar de o deputado relator da proposta ser o mesmo líder da bancada de governo. O governador não recebeu de sua assessoria qualquer alerta sobre a qualidade estapafúrdia do que estava assinando. Assinou.

Em suma, apesar de vários crivos no Legislativo e no Executivo, dos alertas (tímidos) da AMM, uma lei "inovadora", que pode "envergonhar" seus protagonistas, passou. E passou também sem reparos na Prefeitura de Betim.

Quem levantou os berros foi a Secretaria de Planejamento de Contagem, que questionou estarem faltando cerca de R$ 6 milhões na cota do Fundeb do mês, referente ao ICMS da Educação.

Parabéns aos técnicos de Contagem que alertaram a prefeita Marília Campos. Ela mesma entrou em campo, distribuiu as planilhas que calculam os efeitos catastróficos para 130 dos 853 municípios de Minas Gerais. Justamente os maiores, que abrigam mais de 2/3 da população geral e escolar.

Mas, antes de adentrar na análise, é preciso deixar claros ao leitor alguns dados técnicos.

Essa cota de ICMS, dita de 10% da educação, representa um bolo anual de R$ 1,95 bilhão que se destina à educação de 1,5 milhão de alunos de ensino fundamental de 853 municípios mineiros.

A lei, em vigor desde 1º/1/2024, determinou que Belo Horizonte (147 mil alunos) receberá em 12 meses R$ 2,33 milhões, ou seja, R$ 16,1 por aluno, perdendo, em relação ao ano de 2023, cerca de R$ 170 milhões em recursos. Na outra ponta, o menor município do Estado, Serra da Saudade (850 habitantes), receberá R$ 2,78 milhões (R$ 400 mil a mais que a capital) apesar de contar apenas 99 alunos matriculados - R$ 28 mil para cada um. Números impossíveis de terem equidade e proporcionalidade.

O que fez mal o aluno de Belo Horizonte para ter apenas R$ 16, e o que fez bem o aluno de Serra da Saudade para receber R$ 28 mil?

Apesar das boas intenções iniciais, acabou saindo um resultado inquestionavelmente constrangedor, não apenas para os alunos.

Até porque tanto a Lei Robin Hood quanto o Fundeb geraram um equacionamento no decorrer dos anos numa distribuição acintosa do passado. Um erro que tem que ser urgentemente corrigido.

Atualmente, a retenção de 25% dos repasses de impostos federais e estaduais é alocada no Fundeb e distribuída com critério de proporcionalidade, essencialmente numérico, pois perante a lei "todos somos iguais".

Parece justo, o fundamental acolhe os filhos das famílias mais carentes, aquelas sem recursos para pagar mensalidades de escola particular. Os critérios do Fundeb deram dignidade a qualquer município de norte a sul, rico ou pobre, um valor por aluno, proporcionando uma evolução de qualidade significativa e condições de cerca de R$ 7.000 por aluno (em Minas) de "meio período" (quatro horas).

O incrível é que a lei passou "silenciosamente" por vários crivos. O descabimento foi detectado só agora, uma afronta aos requisitos de moralidade e demais, imprescindíveis a uma partilha de recursos públicos destinados aos alunos de escolas públicas de Minas. Outra planilha de iniciativa da Secretaria de Planejamento de Contagem, apresentada na sexta-feira, propõe corrigir as discrepâncias estridentes do que está em vigor.

Mais do que uma caça aos erros, espera-se que com maturidade e urgência se concilie uma revogação da lei e critérios constitucionais mais equânimes. (O Tempo 04.02.2024)