ENTRETANTO

Entretanto

Por: Renato Zupo | Categoria: Justiça | 30-10-2019 13:30 | 863
Foto: Reprodução

O Coringa
O filme sobre o maior vilão dos quadrinhos, o Coringa, talvez tenha ganhado seu intérprete maior em Joaquim Phoenix. Ele encaixou muito bem no papel do palhaço do mal, que só tem em Pennywise, de Stephen King, um parâmetro pop seguro. Bem, críticas de arte à parte, percebo muito pseudoanalista entendendo o filme como um sinalizador de tendências comportamentais violentas. Balela. Relembro aqui dois atentados marcantes da nossa moderna história, e que demonstram que tramas violentas não necessariamente deflagram imitadores violentos, serial killers ou fomentam o mau – e vice versa. O assassino de John Lennon, Mark Chapman, baseou sua ação insana em seu livro de cabeceira, O Apanhador no Campo de Centeio, de J.D. Salinger, obra em que não se narra uma só cena de violência explícita. O cidadão que tentou matar o então presidente Ronald Reagan, Jhon Hincley, também na mesma época, o fez tentando impressionar a atriz Jodie Foster, de quem era fã. Ou seja, gente violenta, psicopatas, com ações assassinas embasadas em obras literárias não violentas ou em amores não correspondidos. Isso mostra que o sujeito pirado e mau não precisa se inspirar em filmes ou séries para descambar do mundo do faz de conta para a violência real. Qualquer influência externa, por mais aparentemente terna e pura que seja, pode provocar esse desvio. O que incomoda no filme Coringa, que me desculpem os pseudodoutores em análise comportamental, é que se trata de mais um exemplo de Bandidolatria. Até bem pouco tempo atrás, vilões eram exemplo de gente derrotada que acabava atrás das grades ou morta – ao menos em obra de ficção. Agora são protagonistas, não só no filme do arqui-inimigo do Batman, mas também em séries como La Casa de Papel, Narcos e Breaking Bad. A Bandidolatria atinge, inclusive, grandes mídias, que teimam em considerar bandidos e traficantes dos morros cariocas como vítimas da sociedade, e não como seus algozes.

Posse na Academia
Araxá é muito especial. Só em um lugar como esse teríamos uma Academia Literária como a nossa. Digo “nossa” porque também, humildemente, a ela pertenço. E a composição da Academia Araxaense de Letras é de homens e mulheres brilhantes, exemplares, dedicados às letras, e fica cada vez mais empática e erudita com seus novos membros, que tomaram posse a semana que passou: o bom amigo e valoroso promotor Dr. Marcos Paulo de Queiroz Macedo, Rodrigo Feres, Luiz Humberto França, Estevão Xavier, José Otávio Lemos…. Tudo gente brilhante, mentes argutas, talento e caráter inigualáveis, que tornam Araxá, e sua academia, cada vez mais especiais.

O Tico e o Teco
Moro e Bolsonaro vivem uma relação muito estranha. O Presidente quer incensa-lo, acredito eu, para com isto enaltecer sua gestão, garantir sua governabilidade e propiciar, quem sabe para um futuro próximo, a tão sonhada vaga no STF para o ex-juiz, seu atual ministro. Quanto a Moro, deve discordar de muito daquilo que seu chefe diz e fala, ele e seus assessores mais diretos, filhos, militares e Olavistas. Afinal, Moro sempre foi um moderado. Enquanto conseguir ficar calado sem que este silêncio seja encarado como um escândalo, quando sua ausência de protestos não se confundir com covardia intelectual, permanecerá Moro no cantinho dele tentando implementar suas reformas. Se a coisa degringolar muito, se o caldo entornar demais, teremos ruptura. Aí o governo Bolsonaro se problematiza mais ainda e Sérgio Moro perde o emprego.

Os Supersalários
O Parlamento quer criar regras para os supersalários e evitar que servidores públicos recebam acima do teto constitucional. Bom, que os congressistas comecem vigiando os próprios contracheques. Quanto aos supersalários, necessário explicar que todos os tentáculos da administração pública direta brasileira, nos três poderes, têm limitadores de vencimentos, o que chamamos no setor público de “proventos”. Pela Constituição, o teto é regrado pelo salário do servidor ou agente público hierarquicamente superior. No executivo federal, o salário do Presidente da República delimita o resto. No legislativo da União, o salário do presidente do Senado. No legislativo estadual, do Deputado presidente da respectiva Câmara… E por aí vai. Enfim, você entendeu. Através de uma Emenda Constitucional em 2006/2007 se criou esta política, aumentaram-se substancialmente os proventos (era período de vacas gordas) e se determinou que daí em diante acabassem os “penduricalhos” - que são benefícios, direitos, parcelas indenizatórias, auxílios alimentação, etc… que não incorporam ao salário mas que incorporam ao vencimento e `à conta bancária do servidor favorecido. O combinado era aumentar o salário, criar o teto e dali em diante nada mais de auxílios, benefícios, etc… Só que os proventos foram defasando ao longo do tempo e os penduricalhos foram voltando. É por isso que, hoje, temos um teto de vencimento para o poder executivo de cerca de 37 mil reais, que é o salário do presidente da república, e há servidores deste mesmo Executivo ganhando cinquenta, sessenta mil. Isso se repete em outros poderes. Pra acabar de novo com o penduricalho, é necessário aumentar o salário do funcionalismo de novo, tornar os proventos novamente polpudos. Ou acabar com a cultura brasileira de mais de duzentos anos de que o serviço público deve remunerar bem, deve enriquecer, deve pagar tão bem quanto a iniciativa privada. Isso não existe em outras democracias do mundo. O serviço público deve ser mínimo, eficiente, sem supersalários. E quem está falando isso com vocês, não se esqueçam, é um servidor público.
RENATO ZUPO, Magistrado, Escritor