Vivemos um momento da história brasileira repleto de dúvidas e incertezas. E quando nos referimos à empregabilidade e ao mundo do trabalho as incertezas são ainda maiores.
O crescimento populacional das zonas urbanas Brasil afora e os diversos processos sociais que geram cada vez mais o êxodo rural são fatores que têm aumentado significativamente a quantidade de pessoas desempregadas e consequentemente gerado um volume maior de candidatos para poucas vagas de emprego.
Diante dessas condições o mundo do trabalho está mais exigente que em tempos passados. Cabe destacar que a expressão mercado de trabalho refere-se ao coletivo das organizações empresariais e institucionais nas quais os trabalhadores almejam atuar. Já o mundo do trabalho é uma expressão mais moderna que contempla não apenas as possibilidades de atuação em uma organização gerida e conduzida por terceiros, mas também as possibilidades do indivíduo ser o protagonista da sua empregabilidade e da geração da sua própria renda. Essa mudança de concepção terminológica engloba também o empreendedorismo como o “salvador dos desempregados”.
Nesse cenário de mudanças, incertezas e de competitividade intensa a educação tem se tornado ainda mais importante, afinal ela é o maior direito concebido aos cidadãos visando à transformação da realidade social dos indivíduos. É importante destacar que legislação educacional federal estabelece que o objetivo principal da educação pública é preparar os indivíduos para o exercício da cidadania e para o trabalho.
É comum ouvir dos estudantes, desde os primeiros anos do ensino fundamental, que estão estudando porque desejam no futuro conseguir um “bom trabalho”. O tempo vai passando e as crianças e adolescentes ampliam suas percepções sobre a importância de possuir um trabalho que possa garantir-lhes uma qualidade de vida mais interessante e satisfatória, tanto para si, como para os seus, pois ouvem seus pais refletirem sobre isso cotidianamente em seus lares.
Essas crianças e adolescentes tornam-se jovens e as suas responsabilidades pessoais e sociais tendem a aumentar, além disso as suas necessidades individuais também se ampliam e a importância de possuir uma renda própria passa a ser a prioridade desses jovens.
Porém, ao buscarem as suas primeiras oportunidades no mundo do trabalho eles percebem que estão diante de uma realidade para a qual não foram preparados pela escola, principalmente pelas públicas da maioria dos municípios brasileiros. Isso porque a educação básica pública do nosso país infelizmente não é básica apenas enquanto nível de educação (aqui estamos nos referindo à educação infantil, ao ensino fundamental e ao ensino médio), mas sim básica em relação à profundidade dos conteúdos trabalhados com os estudantes e mais ainda em relação à sua preparação para atuar profissionalmente nessa fase da sua vida que por questões de natureza biológica e psicossocial já é tão complexa.
As constantes mudanças na legislação educacional brasileira ao longo da história têm colocado os jovens em idade de ensino médio como reféns de políticas públicas que nem sempre são planejadas e elaboradas pensando nos interesses da sociedade. Já tivemos no Brasil, nas décadas de 1970, 1980 e meados da década de 1990 a obrigatoriedade da profissionalização no ensino médio, tivemos a ruptura dessa obrigatoriedade de um ensino médio profissionalizante com a LDB de 1996 e mais adiante na primeira década dos anos 2000 tivemos a volta da possibilidade do ensino médio formar para profissões técnicas.
Mais recentemente tivemos a “desorganizada” reforma do ensino médio promovida pelo ex-presidente Michel Temer que visou à implementação do chamado “Novo Ensino Médio”, que na verdade de novo até agora não apresentou nada, mas refletiremos sobre essa “política pública desastrosa” em um próximo artigo.
Com tantas mudanças, idas e vindas, reformas e retrocessos de legislação o jovem brasileiro infelizmente não consegue se preparar para o mundo do trabalho na maioria das escolas públicas de ensino médio, afinal essas escolas não estão preparadas para garantir uma formação que seja suficiente para possibilitar o ingresso em atividades profissionais, ainda que em atividades básicas.
Diante dessa situação a juventude é jogada no mundo do subemprego tendo que atuar profissionalmente em atividades que não exigem nenhuma formação profissional, com baixos salários e condições de trabalho que não são as melhores, sendo ocupações profissionais nas quais terá poucas, ou melhor raras, possibilidades de crescimento profissional. Além disso, os modernos processos de uberização social estão levando os jovens a novas possibilidades de adquirir renda para si e para os seus através de atividades totalmente informais que não garantem os mínimos direitos trabalhistas e tão pouco segurança em seu contexto amplo.
A solução para esse caos social existe e não é recente: a educação profissional. Essa modalidade educacional prevista na Constituição Federal de 1988 e na atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação tem como propósito formar o indivíduo para o exercício de profissões básicas (aquelas que possuem características de auxiliar, de assistente, etc.), para profissões técnicas de nível médio e para profissões técnicas de nível superior – os cursos superiores de tecnologia (que praticamente não são divulgados no Brasil).
A implementação de políticas públicas que garantam à população brasileira o acesso à educação profissional é urgente e necessária para que a realidade do mundo do trabalho seja modificada.
Governos estaduais e municipais precisam investir em educação profissional visando qualificar os trabalhadores para atender as necessidades da população em idade produtiva e também para atender as necessidades dos empregadores que muitas vezes ofertam vagas e por falta de profissionais qualificados enfrentam dificuldades diversas para manter suas empresas em funcionamento e também para a expansão empresarial.
Exemplos de sucesso em relação à educação profissional são os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia – popularmente conhecidos como IFs, as iniciativas dos governos estaduais de São Paulo com a rede de educação profissional “Centro Paula Souza”, a rede de educação profissional do Estado do Rio Janeiro, e também as instituições do sistema S que ofertam educação profissional. A diferença entre essas as principais ofertantes de educação profissional é que os IFs e redes estaduais atendem a população sem a cobrança de taxas, com cursos 100% gratuitos, enquanto que as instituições do sistema S recebem grandes volumes de recursos financeiros oriundos das folhas de pagamento de salários das empresas que representam, pois há uma legislação que garante o repasse obrigatório de recursos para tais instituições. Além disso, o sistema S também capta recursos públicos em editais dos governos, gerando assim melhores condições para sua atuação em relação às outras instituições de educação profissional, e embora essa situação mais favorável as instituições do sistema S nem sempre ofertam cursos gratuitos e em quantidade suficiente para atender as demandas da população.
Pesquisas científicas apontam que trabalhadores que possuem cursos de qualificação profissional possuem melhores salários em relação àqueles que possuem apenas ensino médio. As mesmas pesquisas apontam ainda que os trabalhadores que possuem cursos técnicos de nível médio aumentam as suas condições de empregabilidade e seus salários também são maiores em relação aos trabalhadores que não possuem tal formação.
Assim, está claro que investir em educação profissional, seja na qualificação profissional ou em cursos técnicos, e mais ainda em cursos superiores de tecnologia, agrega valor aos currículos dos trabalhadores e ao mundo do trabalho seja no contexto municipal ou estadual.
Mundo do trabalho e educação profissional são duas temáticas que se relacionam diretamente e que necessitam da atenção dos governantes para a conscientização dos trabalhadores sobre a importância de se qualificarem e de buscarem oportunidades de formação.
A formação profissional em cursos que possuem qualidade pedagógica certamente garantirá aos jovens melhores condições de atuação profissional e isso culminará em melhor qualidade de vida.
Dr. Cícero Barbosa: atualmente é Secretário Municipal de Ciência, Tecnologia, Educação Profissional, Ensino Superior e Trabalho na Prefeitura Municipal de São Sebastião do Paraíso, e professor no ensino médio da rede pública estadual. É Doutor em Educação Escolar (com tese na área de educação profissional) pela Faculdade de Ciências e Letras da UNESP - Universidade Estadual Paulista - Câmpus Araraquara (SP), Mestre em Educação Escolar pelo Centro Universitário Moura Lacerda de Ribeirão Preto (SP), especialista em Educação Empreendedora pela UFSJ - Universidade Federal de São João Del Rei (MG), e graduado em Licenciatura em Pedagogia pelo Centro Universitário Claretiano de Batatais (SP).